sexta-feira, 28 de março de 2008

Laços..

Para manter a linha, pós texto de Clementine, mais uma relíquia que demonstra a genialidade do Bardo ( e uma nostalgia de minha parte).

Se minha carne fosse pensamento
A distância jamais me reteria;

Apesar dos espaços, em um momento,
E bem longe, a ti eu chegaria.

Que importa onde meu pé pudesse estar,
Em que terra de ti tão afastada ?

O pensamento salta terra e mar
Só de pensar na terra desejada.

Morro ao pensar que não sou pensamento,
E que sonhar distâncias não consiga;

Sou feito de águas e terras, os elementos
Que ao tempo ocioso e à minha dor me obrigam.

De lentos elementos me resigno,
A ter somente as lágrimas, seus signos.

A um dia de verão como hei de comparar-te ?
A um dia de verão como hei de comparar-te ?

Vencendo-o em equilíbrio, és sempre mais amável !
Em maio o vendaval em ternos botões disparte

E o estio se consome em prazo não durável.
Às vezes, muito quente, o olho do céu fulgura,

Outras vezes se ofusca com a sua tez dourada;
Decai da formosura, é certo, a formosura,

Pelo tempo ou o acaso é enfim desadornada:
Mas teu verão é eterno, e não desmaiará.

Nem hás de a possessão perder tua beleza,
Vagando em sua sombra, o fim não te verá,

Pois neste verso eterno ao tempo, tu te igualas:
Enquanto o homem respire, e os olhos possam ver,
Meu canto existirá, e nele hás de viver.

William Shakespeare
Poutz, tem como não admirar as palavras?

domingo, 23 de março de 2008

Recomeçar...

É Páscoa.

Fora qualquer tipo de simbologia religiosa, acho válido pensar num sentido além, o renascimento. Tanto para cristãos ou judeus, a base é a mesma: é possível uma renovação, o renascer apesar dos problemas de percurso.

Não perdendo de vista a comemoração do Mabon, ritual pagão do equinócio de Outono que, bem como a descrição acima, prega a renovação, uma época de introspecção, meditar, rever os erros e começar a modificá-los!

Não sei se é porque me encontro passando por esse dilema, acaba vindo a calhar a idéia de romper um ciclo. É possível que nem sempre essa quebra seja motivada por processos ruins, pode ser que algumas pessoas decidam recomeçar quando estão no ápice da roda, mas convenhamos que são situações singulares e exporádicas.

O recomeço pode ser constante, não numa data pré-determinada, ele ocorre no momento que achamos propício. Parafraseando Drummond em uma de suas poesias:

"Para ganhar um Ano Novo que mereça este nome, você, meu caro, tem de merecê-lo, tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente. É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre."¹

É difícil recomeçar por vários motivos, entretanto o mais complexo é o comodismo somado a falta de confiança. Esperamos por muitas vezes um sinal, divino ou não, de que esse é o momento, sendo que o sinal está dentro de nós o tempo inteiro, que é a insatisfação.

Viver empurrando com a barriga as situações por medo, contando os minutos para o passar dos dias, isso é um suicídio diário. O propósito da vida é simples: viver plenamente, ser feliz... Pode soar como auto ajuda, mas é verdade.

Se por milhões de anos o mundo vem se adequando as mudanças, por que não podemos fazer da mesma forma?

É uma questão de prioridade.

Pois então meus amigos, já fizeram um balanço de suas vidas?


Postado ao som de: Enya - Sumiregusa

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¹ Receita de Ano Novo - Carlos Drummond de Andrade



quarta-feira, 12 de março de 2008

Deixando este blog cada vez mais poético...um petardo de Fernando Pessoa...

Poema em linha reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Sublime!!!

segunda-feira, 10 de março de 2008

Bares e tavernas.

Como aparentemente só eu escrevo nesse bar, vou deixar com vocês as palavras do bardo a entoar. (ê rima horrenda viu, isso é porque eu ando a falar quase sozinho no butecos- sem apóstrofe mesmo).











LXXVIII

Tão freqüentemente te invoquei como musa,
E um apoio tão lindo encontrei para o meu verso,
Que toda caneta estrangeira pegou minha mania,
E sob ti a poesia deles dispersa.
Teus olhos, que ensinaram os mundos a cantarem,
E a pesada ignorância a alto voar,
Acrescentou pena às asas dos sábios,
E deu à graça uma dupla majestade.
E contudo estejas super-orgulhosa daquilo que eu compilo,
Cuja influência é sua e de ti proveio:
No trabalho de outros apenas remendas o estilo
E suas artes com tuas doces graças ficam melhoradas;
Mas tu és toda minha arte e aumentas,
Tão alto quanto o conhecimento, a minha rude ignorância.

Bom, sendo sincero como todo bebum o é. Enjoei um pouco das leituras de peças do velho Shakespeare, mas os sonetos dele são um deleite, admiro a forma, a expressão, o conjunto. É estranhamente belo. A versão original



LXXVIII



1. So oft have I invoked thee for my Muse,
2. And found such fair assistance in my verse
3. As every alien pen hath got my use
4. And under thee their poesy disperse.
5. Thine eyes, that taught the dumb on high to sing
6. And heavy ignorance aloft to fly,
7. Have added feathers to the learned's wing
8. And given grace a double majesty.
9. Yet be most proud of that which I compile,
10. Whose influence is thine, and born of thee:
11. In others' works thou dost but mend the style,
12. And arts with thy sweet graces graced be;
13. But thou art all my art, and dost advance
14. As high as learning, my rude ignorance.

Pra quem gosta, os sonetos de shakespeare são formados por três quartetos e um dístico, e são alexandrinos, ou seja, cada verso tem 12 sílabas poéticas. Eu acho que é isso, não lembro bem na verdade...rs
Po, popopo, por ho ho hoje é só p pe p pessoal.

PS: a maravilhosa imagem é de John William Waterhouse, chama-se windflower e o sujeito era excelente.Ver as pinturas do cara acabam me deixando extremamente frustrado, pois eu lembro que se eu for desenhar uma lua minguante ela acaba por parecer uma banana - e não estou falando de uma banana bonita- terrível isso.

domingo, 2 de março de 2008

Conto

Continuando com o 'surrealismo', postarei um conto - preciosismos a parte- de minha autoria.
É infanto-juvenil, então nada de espantos na caixinhas abaixo. Inté


O ano era de 1006, nas proximidades do que hoje é a catalunã...
Nos arredores de um castelo, no fim da tarde, olhando fixamente para uma montanha enevoada, duas crianças sentadas na grama macia, estão praticamente imóveis, como se sua inocência os fizesse vislumbrar o futuro, até que:
- Sabe Joana, papai, antes de me pôr para dormir contou-me uma estória sobre um reino fantástico, com guerreiros, trols, nesse momento, o pequenino se levanta e golpeando o ar com uma espada imaginária, continua... Ah! Como eu queria viver lá! Uma vida repleta de aventuras, se.
A menina o interrompe, segurando a mão dele e diz:
- E se eu te dissesse que ontem sonhei que era um dragão?
O garoto franze a testa e arremata.
- Dragão?!?!?! Aquele bicho de cara feia que solta fogo e engole pessoas, mas você é mulher, não seria... dragona?!?! Após dizer isso, ele a fita suavemente com um sorriso curioso nos lábios.
-Não zombe de mim, ela diz, estou falando sério.
-O que você quer dizer com sério, você é uma normal!
-Normal sim, mas será que sou comum?
-Joana, pára com isso, imagina só se você virasse mesmo um dragão, dragona, fada, sei lá, você ainda tá sonhando sua boba, disse Caio Maximus do alto dos seus sete anos de experiências místicas, chamada vida, e após dizê-lo com toda a convicção, mostrou-lhe a língua. Joana nada respondeu, apenas inclinou a cabeça, e voltou a olhar a montanha.
- Olha, Olha, Olha, diz ela com um sorriso de satisfação no rosto, apontando para uma nuvem em destaque, O que aquilo parece?
Caio olha, olha reolha e diz coçando os olhos:
-Acho que entrei no seu sonho também, diz ele atônito, estou vendo um dragão...
Joana sorri aliviada e diz:
-Acho que sei o que aconteceu, nunca conheci papai, então...ele deve ser um dragão, em meio a devaneios, Caio a interrompe.
- Joana, pára, eu já te disse, e se você for mesmo um dragão, o que você vai fazer? Tem caçadores lá fora, e principalmente, quem vai brincar comigo? Tia Branca de neve? Mas ela nem agüenta correr!!! Caio se agita mais e mais e percebe que Joana ainda se encontra em devaneios. Ela o olha com um olhar sereno como um lago e suas palavras soam como a brisa de verão que sopra por esse mesmo lago, afáveis e tenras.
- Caio, escute-me, então você acredita em mim, não é? Afinal, como poderiam existir caçadores de algo que não existe? Seria o mesmo que orar para algo que não se sente.
- Joana, diz ele tristonho, não gosto de achar que você possa me deixar assim, um dragão deve querer voar por aí, né, além do mais, ainda acho que você está delirando.
-Delírio ou não, acho que papai me deu esse estranho sobrenome para selar quem eu sou, até que esteja pronta.
-Selar, sobrenome, você não está delirando, está é doida mesmo, se fosse por conta de sobrenome o meu ecoará em salas escuras como MAXIMUS, O GLADIADOR, gritou ele, novamente brandindo sua espada imaginária. Joana sorri e emenda:
- Claro, claro, e desde quando vou ser esposa de um gladiador?
-Você não terá opção, quem além de mim casará com uma dragona, diz Caio, soltando sua espada e indo ao chão dando sonoras gargalhadas de sua própria piada.
-Seu bobo, eu vou te devorar, ela diz, fingindo uma careta assustadora. Caio já recomposto, senta-se de pernas cruzadas e diz:
- Ta bom,então como seu pai te selou? O fato de você ter minha idade e ser maior do que eu nada quer dizer... Novamente mostrando a língua.
-Não tenho sua idade, sou 12 luas mais nova, e além do meu sobrenome ainda tenho isso, disse ela, enquanto tirava de um pequeno bolso, um objeto brilhante.
-O que é isso?
- Um rubi seu tonto, o rubi brilhava como se fosse um sol de rubra cor.
-Uau!
-É, uau...
- E quais são as palavras mágicas? Shazam, yupi, hocus pocus, abracadabra, abre-te sésamo? Caio obviamente diz isso desdenhosamente. Joana olha para o céu como se fosse tocá-lo e diz:
- Eu estou ouvindo.
-Ouvindo o quê?
- Olhe o céu!
Caio olha espantado para o céu e vê o sol quase se pondo, transformando-se, ficando da cor da rubi, e como se fosse tragado para dentro daquele brilho, o pequeno só ouve sussurros, nos quais só consegue distinguir...
- Não se preocupe, eu estarei contigo, só te peço que não se esqueças de mim, afinal, quem mais casaria com uma...
Após um som estridente e um vento forte, caio é jogado ao chão, ao virar-se para o céu só vê a sombra de uma imensa figura fazendo sombra ao sol.
- Joana? Ca, cadê você? Uma pequena lágrima escorre em seu rosto, ele a enxuga com as mãos:
- Nã...não posso ir contigo, nã...não mais , diz ele soluçando – mas não vou te esquecer...nunca, e exalando todo o ar em seus pulmões, ele grita:
- Eu sempre vou estar aqui...esperando!
De lágrimas incontidas ele se afasta do cenário, que visitará dalí em diante, todos os dias, até que as florezinhas, gramíneas, brisa, montanha, nuvem, o que seja, participe junto a ele do reencontro daquela que um dia ele ousará chamar... Minha .

sábado, 1 de março de 2008

escreveram prá mim, mesmo sem merecer...



A neblina cai densa
e mostra as partes mais escondidas de sua casa
quase impossíveis de se ver
aperto meus olhos...
Ventos pesados do norte errante
uivam ao me contar de uma Dama
que mora naquela Floresta inebriante
Ai meus ancestrais! o que salva destas tentações infernais
uma Dama que sempre triste almeja encontrar
a Fonte do êxtase e do Sorriso, por isto , teve um preço
que nenhum mortal desta Terra ousou pagar
Oh Lady Bewitched! ,
deixai-me morrer embriagado
de luxúria em teu colo, em prazeres desvairados
Oh Dama do meu Castelo de Ilusões surreais
posso eu ser dono de minha vontade
diante de suas formas esculturais?
Vem,
vem minha Lady,
envolta em volúpia
a Libido do Vento das Cachoeiras
Cavernas e... Danças do Benevento
Unamo-nos a elas as Bruxas em seu Sabbath anual


Obs: :o

para um "meu amigo"

Um dia, um "meu amigo" me disse que o que ele mais queria descobrir é o que passa na cabeça de uma mulher entre a pia e o fogão. Então, "meu amigo"....leia abaixo...

Dona de Casa x Casa da Dona


Mistérico

Elas lavam louças

E desintegram a cozinha

Num gozo volátil de detergente.

Arranham as panelas como éguas

Que engolem o mundo com os dentes.

Se penteiam como cadelas

Lambem os seus corpos

Como as esponjas lambem panelas.

Como brilham...Como brilham...

Descascam as batatas

Cortam maçãs

Arreganham vaginas aquáticas

Enquanto descaroçam romãs.
(by Márcia Frazão)